"Olhos de pai"
Criei coragem de escrever este relato depois de verificar o constante sofrimento por que está passando meu filho de apenas 10 anos, aluno do sexto ano do ensino fundamental.
João Pedro é uma criança alegre, feliz, comunicativa e de muitos amigos. Transforma qualquer ambiente em um grande circo. Tem sempre uma estória para contar e uma música para tocar e cantar. Eclético, mas não esconde a preferência pelo Rock.
Naquela quarta-feira, em que o Ex-Presidente Lula foi conduzido coercitivamente mediante cobertura cinematográfica da grande mídia, depois de um dia inteiro na escola, ainda fez aula de violão e piano.
Mas algo o incomodava, a criança alegre e feliz estava inquieta e agitada. Olhava desconfiado por todos os lados, parecia procurar algo, e ao mesmo tempo não compreendia o que estava acontecendo.
Ouviu e viu na televisão e na internet que as pessoas estavam se agredindo. Sentiu medo, talvez por ser filho de pais que, embora não filiados a nenhum partido político, são filhos da esquerda.
Não aguentando mais seu coração desabou e disse:
“__Pai, olha o que estas pessoas estão fazendo. Vão trazer a ditadura de volta. Eles não têm noção do que os outros já sofreram no passado. Já estudei a ditatura e não quero ela de volta”.
Seus olhos castanhos se avermelharam e se encheram de lágrimas.
Naquele momento, sem querer julgar as ideologias mas pesando os limites que devemos ter em nossas atitudes, por um breve momento notei que a fala do menino se assemelhava à passagem do Evangelho de Lucas 23: 34 :
“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
Para confortá-lo, dissemos:
“__Filho, vá tomar seu banho e relaxe, dessas questões o papai e a mamãe se preocupam por você”.
Não sabia o menino que, no dia de ontem (11/04/2016), sua fala seria reproduzida pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal - Marco Aurélio de Mello, no sentido de que se o impeachment passar na Câmara, haverá risco de conflitos no dia seguinte, em razão da reação popular – o que demandaria repressão forte para se manter a ordem.
Passados alguns minutos sai do banheiro, enrolado na toalha, e diz:
“__Melhor mesmo seria se as crianças governassem o mundo. Tudo seria diferente, os adultos só pensam em brigar, tudo é dinheiro”.
Disse, ainda, que não consegue entender como os adultos brigam tanto e estão fazendo seus filhos brigarem com os outros, que se as amizades acabarem é culpa dos pais, se referindo á onda de ódio que se espalha pelo nosso país.
A mãe, como um anjo sempre presente diz: “João Pedro para Presidente”.
O que me deixou preocupado, ao mesmo tempo me fez orgulhoso diante do fato de que meu filho já tem a visão de um mundo melhor e está disposto a lutar por ele.
Talvez o que lhe tenha dado um mínimo de consciência política e social, dada sua tenra idade, seja o fato de ter nos presenciado, desde o ventre da mãe, nos movimentos sociais e religiosos, participando de audiências públicas e outras atividades voltadas para a cidadania.
Embora filho único, ao contrário de tudo que dizem sobre eles, não é egoísta e aprendeu desde pequenino a dividir, a ver os mais necessitados com olhos puros, sem preconceito. Aprendeu a olhar aqueles que estão sozinhos, distantes, e deles aproximar-se e fazer amizades.
Um grande amigo diz que deveria ser embaixador, e que já demostra talento para a política, mas ele só quer ser criança. Não quer nada mais, apenas correr, brincar e cantar, com crianças iguais a ele, independente de cor, sexo, credo religioso e ideologia partidária de seus pais ou cor da camiseta que usam.
Está cansado de ouvir que tudo está difícil, dos adultos, seja na igreja, escola e outros seguimentos, quererem lhe tirar a esperança, afirmando que o mundo só está piorando e que tudo vai acabar.
E quanto a mim, se perguntares o que quero, só posso dizer que não quero mais ver o medo nos olhos do meu filho, por isso fizemos a opção de que do nosso lado só teremos otimistas.
(Edson e Rose)
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